É preciso condenar
severamente quem
crê nos bons sentimentos
e na inocência.
É preciso condenar
com a máxima severidade quem
ama o subproletariado
sem consciência de classe.
É preciso condenar
com a máxima severidade
quem ouve em si e expressa
sentimentos obscuros e escandalosos.
Estas palavras de condenação
começaram a ressoar
no coração dos Anos Cinquenta
e continuam até hoje.
Entretanto a inocência,
que efetivamente havia,
começou a perder-se
em abjuras, corrupções e neuroses.
Entretanto o subproletariado,
que efetivamente existia,
terminou se transformando
em reserva da pequena burguesia.
Entretanto os sentimentos
que eram por natureza obscuros
foram todos investidos
no lamento das ocasiões perdidas.
Naturalmente, quem condenava
não se deu conta de tudo isso:
e continua rindo da inocência,
negligenciando o subproletariado
e declarando sentimentos reacionários.
Continua indo da casa
pro escritório, do escritório pra casa,
ou ensinando literatura:
está feliz com o progressismo
que lhe faz parecer sagrado
o dever de ensinar aos domésticos
o alfabeto das escolas burguesas.
Está feliz com o laicismo
que considera é mais que natural
que os pobres tenham casa,
carro e tudo mais.
Está feliz com a racionalidade
que o faz praticar um antifascismo
gratificante, elevado
e sobretudo muito popular.
Que tudo isso seja banal
nem lhe passa de longe pela mente:
com efeito, que seja assim ou assado
não lhe dá nenhum proveito.
Aqui fala um Sócrates mísero e impotente
que sabe pensar e não filosofar,
mas que no entanto se orgulha
não só de ser um conhecedor
(o mais exposto e esquecido)
das mudanças históricas, mas também
de nelas estar direta e
desesperadamente implicado.
(Pier Paolo Pasolini em La Nuova Gioventù, de 1975, o mesmo ano de sua trágica e até hoje misteriosa morte.)