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O primeiro LP de Elvis, que é também o primeiro disco de rock'n'roll que ganhei na vida |
Acho que foi em julho de 1996, numa segunda-feira. Estava assistindo uma entrevista de Eli Corrêa com o famigerado Padre Quevedo em um final de tarde. Naquele dia o Padre demonstrava em seu próprio corpo alguns métodos usados pelos ditos charlatões, inclusive atravessando uma agulha pela pele do seu pescoço. Uma tremenda curiosidade pra um moleque de seis anos. Entre uma demonstração e outra, o intervalo comercial rolou. A locução dizia que naquela noite haveria um “Festival Elvis Presley”, começando com a exibição de O Prisioneiro do Rock. Confesso que aquela imagem em preto e branco na velha televisão de tubo com a imagem granulada, além do som de Jailhouse Rock me hipnotizou. Precisava assistir aquilo. Certa ansiedade tomou conta de mim. Não via a hora de chegar às 22h. Estava na casa dos meus avós, então a liberdade era total, nem precisava ir pra cama cedo. Fiquei ligado na telinha, até que a sessão começou. Vince Everett, o personagem de Elvis, matava um homem a socos logo na primeira cena e ia pra cadeia. Precisava ver aquilo até o final. Não demorou muito e logo as canções escritas por Jerry Leiber e Mike Stoller começaram a rolar. Escutar a voz daquele cara e a guitarra de Scotty Moore foi uma porrada que tomei na cabeça e no coração. Nunca tinha ouvido nada igual. Era simples, verdadeiro, cheio de atitude e melhor do que todas aquelas ondas infantis que rolavam na época. Era rock’n’roll, ou seja, música de verdade. Uma sensação única, como o primeiro orgasmo ou aquele cigarro roubado do maço de alguém que você fuma escondidinho e relaxa o seu corpo todo. Pura mágica. Assisti o filme até o final, inclusive a antológica sequência de Jailhouse Rock. Ali decidi que queria ser igual aquele cara. Acompanhei os filmes que passaram nas semanas seguintes. Louco por Garotas, Com Caipira não se brinca, Viva um pouquinho, ame um pouquinho, Joe é muito vivo e o maravilhoso Elvis Triunfal. Tirando o último citado, hoje acho todos ruins mas sempre acabo assistindo e sou levado aos meus tempos de criança. Criança tomada pelo Rock e pela “Elvismania”.
Naquele mesmo ano, perto do natal, meu pai arrumou um emprego após um difícil período desempregado. Como presente pra família, comprou nosso primeiro rádio com tocador de CD e, curiosamente, me presenteou com aquele antológico disco inicial de Elvis na RCA, o mesmo que tem Blue Suede Shoes, Money Honey, Blue Moon e Tutti Frutti. Dia e noite escutava aquilo e acho que meus vizinhos me detestavam por isso. No mesmo período, descobri uma rádio pirata onde vários sons dos anos 50 eram tocados. O apresentador tinha um acervo fabuloso e descobri que podia ligar e pedir a música que quisesse. Foi através desse programa que conheci Jerry Lee Lewis, Chuck Berry, Johnny Cash e todos aqueles caras fodões que gravaram com Sam Phillips na Sun Records. Em tempos anteriores ao You Tube, era só ligar, pedir a canção e preparar uma fita K7 pra gravar - tenho algumas delas até hoje. Dali em diante, meus heróis deixaram de ser aqueles dos desenhos animados bobos. Eu queria tocar piano como Jerry Lee e fazer os movimentos de karate que o Elvis fazia no palco.
Os anos foram passando, e na escola eu sempre era conhecido como o menino fã do Elvis. Em 2005, um professor muito querido pediu para eu levar todo o material que tinha sobre Elvis. Discos, livros, revistas, CDs. Para minha surpresa, ele anuncia que levará um cover de Elvis na escola. Até hoje alguns amigos me tiram sarro do momento em que fui convidado pra cantar Tutti Frutti com o cara e confesso: me emocionei pra caralho, afinal, nunca poderia ver um show do verdadeiro Elvis (talvez algum dia no céu ou no inferno).
Hoje, 16 de agosto de 2017, é o aniversário da (possível) morte do eterno “Rei”. São 40 anos sem o cara. O dia em que ele deixou o prédio e virou um mito contemporâneo. Sem a música desse cara, não sei os caminhos que a minha vida teria tomado. Talvez teria virado um desses caras que chapam o coco em balada sertaneja ou que acreditam no que o Datena fala na televisão. A música de Elvis Presley foi o trilho para outras descobertas. Uma chave que destravou a minha mente. Sem ela não teria descoberto o rockabilly, o blues, algumas coisas literárias que eu adoro, toda uma cultura pop, além de todo suingue e vigor que o rock’n’roll deixa em nossas vidas. Quem sabe nesta noite fria de agosto Elvis não esteja vivo, cantando em alguma espelunca por aí, fazendo senhorinhas balançar o quadril durante a madrugada e rindo de tolos emocionados como eu. Se tiver, obrigado pelos ensinamentos, Rei. Um dia te vejo em Memphis!